Por Patrícia Muniz
Em 1958, em meio à proibição do futebol e outras práticas esportivas às mulheres, foi formada uma das primeiras equipes de futebol feminino que se tem registros oficiais no Brasil. Foi no Triângulo Mineiro que o Araguari Atlético Clube montou times A e B e realizou a partida beneficente apenas entre mulheres, no dia 19 de dezembro.
Cerca de 25 meninas foram selecionadas em uma peneira organizada pela diretoria do clube, a pedido do Grupo Escolar Vicente de Ouro Preto que passava por dificuldades financeiras e precisava de ajuda na arrecadação de fundos. Sob o comando de Luiz Benjamim, Luiz Teixeira e do massagista José Firmino, a primeira partida foi um completo sucesso e levou o elenco feminino a outros jogos, viajando pelo Brasil. Elas visitaram Uberlândia, Alegre/GO, Ituiutaba, Varginha, Goiânia, Belo Horizonte e Salvador.
“O primeiro jogo foi um sucesso total e continuamos jogando em várias cidades do Brasil” – disse a ex-meio-campista Heloísa Rodrigues, em entrevista ao Globo Esporte, ano passado.
As partidas ocorriam em campos oficiais e a equipe era filiada a um time da Federação Mineira de Futebol (FMF), diferente de outros registros do futebol feminino no Brasil. Pioneiras, as meninas de Araguari vestiram a camisa do Galo e saíram vitoriosas, em um jogo preliminar realizado no Independência, em 1959.
Em Belo Horizonte, naquela época, Atlético e América eram os grandes rivais e já era necessária a separação das torcidas, por causa das brigas. O time de Araguari então se dividiu para uma partida histórica, em que o antigo campo do Sete esteve lotado e com grande festa para celebrar a simbólica vitória alvinegra. A Revista Manchete Esportiva, veiculada em 30 de maio de 1959, relata que as meninas de Araguari empenharam-se em enfeitar as jogadas, com dribles curtos e chutes delicados.

Revista Manchete Esportiva/Reprodução
Naquela época, o futebol feminino aparecia apenas em apresentações circenses ou festivas, com tendência cômica, e as mulheres sequer tinham liberdade para usar os shorts do uniforme. Assim, o que diferenciou a partida ocorrida dos demais jogos disputados entre mulheres na época foi, justamente, seu caráter esportivo e a recepção, tantas vezes positiva, em estádios cheios com torcidas eufóricas. Para a partida em Salvador, por exemplo, ocorreu até um desfile com as jogadoras pelas ruas da cidade, com todos aplaudindo.
“Eu vesti a camisa do Atlético-MG e o restante das meninas, a do América-MG. Vencemos. Foi aquele show, todo mundo gritava, jogava paletó para cima, foi essa festa toda” – conta Zalfa, então capitã do time, de quem esse jogo não sai da memória.
Entretanto, as meninas de Araguari também enfrentaram muito preconceito, principalmente por parte da família e da igreja. Apesar de alguma repercussão positiva, a mídia nacional também não poupou esforços para exigir que o Conselho Nacional de Desportos (CND) cumprisse com a proibição e extinguisse a equipe feminina do Atlético de Araguari.
O sonho acabou com menos de um ano, antes que pudessem disputar a partida internacional a qual elas foram convidadas a participar, no México, no final de 1959, pois o decreto lei 3.199, de 4 de abril de 1941, assinado por Getúlio Vargas, que proibia as mulheres a praticar vários esportes, foi resgatado pelo governo de Juscelino Kubitschek.

Revista Manchete Esportiva/Reprodução
Veja mais sobre a história do time feminino de Araguari em: http://dibradoras.com.br/movidas-por-um-sonho-como-as-mulheres-do-araguari-enfrentaram-a-proibicao-do-futebol-feminino/
Um comentário sobre “Araguari Atlético Clube: as pioneiras vestiram o manto”